“Qual a diferença entre ‘comunidade’ e ‘rede’? Comunidade precede você. Você nasce numa comunidade. Por outro lado, temos a rede. O que é uma rede? Ao contrário de comunidade, a rede é feita e mantida viva por duas atividades diferentes: uma é conectar e a outra é desconectar.
E eu acho que a atratividade do novo tipo de amizade, o tipo de amizade do Facebook, está exatamente aí. Que é muito fácil desconectar. É fácil conectar, fazer amigos. Mas o maior atrativo é a facilidade de se desconectar.
Imagine que o que você tem não são amigos online, conexões online, compartilhamento online, mas conexões offline, conexões reais, face a face, corpo a corpo, olho no olho. Então, romper relacionamentos é sempre um evento muito traumático. Você tem que encontrar desculpas, tem que se explicar, você tem que mentir frequentemente, mesmo assim, você não se sente seguro, o seu companheiro diz que você não tem esse direito, que você é um porco, etc.
É difícil, mas na internet é tão fácil, você apenas pressiona ‘delete’ e pronto. Em vez de 500 amigos, você terá 499, mas isso será apenas temporário, porque amanhão você terá outros 500…
Isso mina os laços humanos. Os laços humanos são uma mistura de benção e maldição. Benção porque é realmente muito prazeroso, muito satisfatório ter outro parceiro em quem confiar e fazer algo por ele ou ela. É um tipo de experiência indisponível para a amizade no Facebook. E eu acho que muitos jovens não têm nem mesmo consciência do que eles perderam porque nunca experimentaram esse tipo de situação.
Por outro lado, há a maldição, pois quando você entra no laço, você espera ficar lá para sempre. Você jura, você faz um juramento: até que a morte nos separe, para sempre. Mas o que isso significa? Significa que você empenha o seu futuro. Talvez amanhã, ou no mês que vem ou no ano que vem, haja novas oportunidades. Agora, você não consegue vê-las, e você não será capaz de pegar essas oportunidades, porque você estará preso aos seus antigos compromissos, às suas antigas obrigações.
Então, é uma situação muito ambivalente e, consequentemente, um fenômeno curioso dessa pessoa solitária numa multidão de solitários. Estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo.
Há dois valores essenciais que são absolutamente indispensáveis para uma vida satisfatória e recompensadora e relativamente feliz. Um é a segurança e outro é liberdade. Você não consegue ter uma vida digna na ausência de um deles. Segurança sem liberdade é escravidão. E liberdade sem segurança é o completo caos, incapacidade de fazer qualquer coisa, planejar qualquer coisa, nem mesmo sonhar.
Então, você precisa dos dois. O problema, no entanto, é que ninguém ainda, na história e no planeta, encontrou a fórmula de ouro, a mistura perfeita de segurança e liberdade. Cada vez que você tem mais segurança, você entrega um pouco da sua liberdade. Não há outra maneira. Cada vez que você tem mais liberdade, você entrega parte da sua segurança. Então você ganha algo e você perde algo.
(Zygmunt Bauman, sociólogo polonês conhecido por suas análises sobre a modernida, pós-modernidade, consumismo e modernidade líquida. Um dos seus livros mais interessantes é Amor Líquido, sobre a fragilidade dos laços humanos)